quarta-feira, 24 de novembro de 2010

As Estações da Alma

Como as estações do ano vêm independentemente da nossa opinião ou vontade, também os impulsos da nossa Alma.
Ao estar com o meu pai durante o dia, apercebo-me da dificuldade que é acreditar no que é real em nós e que temos dentro à espera de sair. E quando digo "à espera", não me refiro a uma tranquila passividade, mas sim a "constantes pancadas na parede de betão que erigimos para calar os nossos sonhos mais queridos", pois mesmo que consigamos convencer-nos a encaixarmos a nossa existência no molde que a sociedade (ou outros) nos "impõe", chega uma altura (ou várias) em que a nossa Alma nos obriga a olhar para nós e para o que nos tornámos. Fá-lo de diversas formas, seja por uma permanente sensação de insatisfação que, um dia, se torna insuportável ou pela acção incompreensível (para nós) de uma pessoa que nos é querida ou da qual estamos dependentes.
Acreditar que, se fizermos mais aquele sacrifício ou, por outro lado, nos deixarmos levar, mais uma vez, por aquele padrão que sabemos não ser saudável, estaremos a evitar que a nossa Alma nos faça confrontar o espelho é, em si, uma atitude de terror. Terror que carregamos connosco todos os dias, em todas as decisões, em todas as palavras e tons de voz, anos e anos a fio. Vamos sacrificando, fazendo concessões, fingindo, mentindo, na esperança desesperada de nos convencer que somos assim e, mais que isso, gostamos de ser assim, porque ser assim é a única forma que sabemos ser.

Hoje, estava, mais uma vez, à volta desta questão enquanto brincava com o Flash, o gato do meu pai, na varanda da casa dele. Tínhamos almoçado e ele fora trabalhar. Um dia ambíguo de Outono com os habituais turnos de sol e nuvens, o quentinho e o súbito frio...Nesse entretanto do tempo, em que as nuvens tapavam o sol e eu provocava o Flash com um brinquedo improvisado de um pedaço de papel, vários pequenos barrufos caíram sobre as lentes dos meus óculos. O vento estava forte e contra a minha face...quando olhei em frente, observei o céu cinzento, o vento frio no meu rosto e as pequenas gotas que se esmagavam contra a minha pele e o meu pensamento foi de que a brincadeira estaria a chegar ao fim, pois chuva e gato não casam propriamente...depois senti uma certa pena, pois começara há pouco tempo e ele estava mesmo contente depois de dias as dormir, todo mole...e cheguei à compreensão de que tal como a Natureza segue o seu curso sem pensar duas vezes, não pede desculpa se nos vem atrasar ou destruir um plano, não se sente culpada, porque não pode corresponder à expectativa de alguém, também quem nós somos verdadeiramente vem sem aviso, revela-se em toda a sua glória, não pede desculpa por existir e atinge-nos onde sentimos mais por muito que isso nos desarme, nos desoriente e nos enfureça.
Ser humano é uma aprendizagem dura, sem dúvida, e, hoje sinto, sem dúvida, que independentemente das minhas resoluções, decisões, acções e vontades, a minha Alma vai sempre expressar-se batendo contra as várias paredes de betão que erigi...a questão é: até que ponto estou apegada a essas paredes e até onde quero levar essa dependência vivendo os dias aterrorizada por dentro de que se largar o controlo, permitirei à minha Alma destruí-las uma a uma?
Respiro fundo, largo a necessidade de ser perfeitamente coerente e rendo-me à realidade mutável da minha Natureza aceitando os empurrões da minha Alma como naturais e, se me sentir num dia especialmente audaz, até desejáveis!

Com Amor,

Sofia

Sem comentários:

Enviar um comentário